terça-feira, janeiro 16, 2007

Artur Ribeiro e a Mudança

Artur Ribeiro e a mudança.



















Nesta foto, Artur Ribeiro está no centro, junto com 4 músicos.
Parecem estar a tocar alguma canção de influência folclórica, pelos instrumentos que estão a ser usados.
Infelizmente, não consigo distinguir quem são os músicos, nem o local onde foi tirado esta foto. A foto data provavelmente de meados dos anos 1950.
Foto de Artur Ribeiro, espólio do artista.


“Um dos aspectos mais salientes da carreira de Artur Ribeiro foi uma drástica mudança no reportório que utilizou. A problemática [da minha tese em torno da personalidade de Artur Ribeiro] está orientada para a análise dessa mudança. Ao iniciar a pesquisa sobre a obra de Artur Ribeiro que deu entrada na Sociedade Portuguesa de Autores entre 1949 e 1978, descobri que compreende cerca de 1000 canções. O seu reportório é composto por categorias de “música ligeira” a que o próprio autor chama “diversos” (canção popular, marchinha, bolero, samba, slow, valsa, baião…), por “canções regionais” (rabela, bailinho, vira, baile de roda, chula…) e por “fado-canção” de 1949 até 1967; a partir de 1967 e até 1978 é composto quase exclusivamente por “fado tradicional”. O reportório do artista entre 1949 e 1966 é diferente do período 1967 a 1978. Pareceu-me interessante descobrir porquê. Para perceber as razões dessa mudança decidi observá-las em vários contextos em relação ao indivíduo, e em relação à sociedade.”

Esta observação tornou-se o centro do problema. Porque razão Artur Ribeiro terá mudado o seu repotório? Tal como se tratasse de uma obsessão, para poder desvendar a razão ou as razões deste problema, tive de conhecer melhor o artista e relacionar a sua vivência e actividade artística com a sociedade e cultura portuguesas. Porque talvez houvesse alguma mudança na própria sociedade ou na cultura que fizesse com que ele a seguisse!

“[Na minha tese] em torno da personalidade de Artur Ribeiro [---] trata-se de estudar ou analisar uma mudança que se verifica na obra de um indivíduo. Não se trata de contar a vida deste artista, mas sim de utilizar a sua vida artística para questionar tal mudança. Não foi meu objectivo tornar esta dissertação numa biografia. Visto Artur Ribeiro ter falecido em 1988 e a investigação ter ocorrido grande parte entre 2002 e 2004, a pesquisa de campo realizou-se, entre outros, através de “terceiros”, indivíduos familiares, colegas ou outros, a exemplo do que se passa com o trabalho de Danielson (Voice of Egypt 1997).”

Deste trabalho não se tratou de escrever uma biografia, como já disse, porque uma biografia, por sua natureza, contem ou pode conter distorções, deformações, ocultações, transposições do real, da parte de quem conta a história.
A biografia é um texto literário, e também é utilizado como uma fonte histórica. Tal como explico na minha tese, “Conhecem-se os riscos da biografia: não temos a “verdade oficial” mas só se pode respeitar a “verdade relativa”, porque “da parte de quem escreve [existe] a tendência para ignorar ou adoçar os aspectos mais mesquinhos ou negativos da pessoa de quem se conta a vida, enaltecendo e heroicisando os seus feitos”. Conclui-se “que a manipulação dessa necessidade de extraordinários, pode facilmente ser abusada por qualquer poder que deseje impôr modelos de comportamento ou outras ideias ficcionadas de nós mesmos” (Rodrigues 2003:18-26).” Por exemplo, a autora Rodrigues lembra que “[...] podemos observar o fascínio que o Estado Novo tinha pelas vidas dos heróis que geraram a ‘raça portuguesa’, utilizando tais biografias e ficções para construir uma ideia de portugueses e de Portugal que lhes interessava, radicando nesse mito, por exemplo, a justificação de um colonialismo paternalista, proviciano e ultrapassado”.

Há que considerar que a biografia é uma ferramenta útil para observar a identidade de um grupo e os seus comportamentos em relação a outros grupos. No entanto, para a escrita da tese, não me foi possível entrevistar o artista por estar falecido vários anos antes da investigação. Para evitar de criar mais distorções, deformações, etc. da parte de terceiros que me contaram partes da vida de Artur Ribeiro cada um à sua maneira, decidi não escrever a biografia do artista mas sim utilizar a sua vida artítica para compreender a razão que o levou a modificar o seu reportório.
Utilizei a vida artística de Artur Ribeiro e eventos socio-culturais para questionar a mudança no seu reportório.